Há exatamente 30 anos, em um 16 de abril, uma passeata saiu da Praça da Sé em direção ao Vale do Anhangabaú, em São Paulo, para declarar um imponente desejo: “eu quero votar para presidente”. Um milhão e meio de pessoas participaram da maior manifestação das Diretas Já e também a maior da história do Brasil. A enorme mobilização paulistana, que encerrou uma série de protestos e comícios por todo o país, foi insuficiente para a aprovação, no Congresso, da emenda Dante de Oliveira, que permitiria as eleições diretas para a presidência já no ano seguinte. Porém, o movimento abriu caminho para a eleição indireta de uma chapa civil em 1985 e o sufrágio universal em 1989.
O agito e a inquietação do povo durante as Diretas Já inspiraram Chico a compor Pelas tabelas, música que abre seu disco de 1984 (e que foi regravada em Uma palavra, de 1995). Na canção, um homem procura por uma mulher no meio dos comícios e, claro, fica enlouquecido com o barulho e a movimentação das pessoas.
Pelas tabelas é um samba difícil de cantar. Ele acelera à medida que passa, ganha intensidade rítmica e vocal e repete freneticamente os seus versos. Em determinado momento, Chico entoa:
“Eu jurei que era ela que vinha chegando com minha cabeça já numa baixela”.
Muitos enxergam aí uma referência ao então presidente militar João Batista Figueiredo, homônimo do primo de Jesus Cristo que teve a cabeça cortada e oferecida numa bandeja de prata à amante. Chico Buarque apenas acha graça da analogia.
Dez anos depois do lançamento, o cantor incluiu a música em seu show, e negava, naquele momento, qualquer conotação política com a decisão.
Na época, à Folha de S. Paulo, ele disse:
No show eu canto uma música que fala [de política] e que agora não tem mais nada a ver com o momento em que ela foi composta. Me perguntaram por que essa música política no meio do show. Mas ela é na verdade um pouco a negação disso tudo. (…) É essa confusão do individual com o coletivo, e aponta muito para o individual naquele momento coletivo. Mas a leitura predominante é a política, que é uma leitura viciada. ‘Pelas tabelas’ é um samba que eu gosto de cantar e que estou cantando nesse show porque ele também tem um pouco essa confusão do “Estorvo” [livro de Chico lançado em 1991], essa barafunda mental.
Pelas Tabelas
Ando com minha cabeça já pelas tabelas
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu pensei que era ela puxando o cordão
8 horas e danço de blusa amarela
Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Quando ouvi a cidade de noite batendo as panelas
Eu pensei que era ela voltando pra mim
Minha cabeça de noite batendo panelas
Provavelmente não deixa a cidade dormir
Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já pelas tabelas
Claro que ninguém se toca com a minha aflição
Quando vi todo mundo na rua de blusa amarela
Eu pensei que era ela puxando o cordão
Oito horas e danço de blusa amarela
Minha cabeça talvez faça as pazes assim
Quando vi a cidade de noite batendo as panelas
Eu pensei que era ela voltando pra mim
Minha cabeça de noite batendo panelas
Provavelmente não deixa a cidade dormir
Quando vi um bocado de gente descendo as favelas
Eu achei que era o povo que vinha pedir
A cabeça de um homem que olhava as favelas
Minha cabeça rolando no Maracanã
Quando vi a galera aplaudindo de pé as tabelas
Eu jurei que era ela que vinha chegando
Com minha cabeça já em uma baixela
Eu amo Chico Buarque ❤
ResponderExcluirE essa música é muito representativa! Adorei o post!
Chico Buarque é mesmo um artista grandioso. Essa é mais uma de suas composições de qualidade e sempre conectada com o período histórico em que foi composta.
ResponderExcluirAdorei o seu post, amo conhece a história por trás da canção, creio que até os próprios fãs desconhece o que está por trás do ritmo/da letra o que na minha opinião empobrece, as musicas dos anos 60,70 e 80 tinham muito disso tem um cantor que denunciava os políticos em suas músicas: Raul seixas.
ResponderExcluirOlá
ResponderExcluirAdoro conhecer as histórias por trás das coisas, e essa canção tem uma história muito interessante por trás dela, só que não sei o que acontece, mas o Chico não consegue me encantar, suas letras são ótimas, mas o ritmo e melodia não me prende.
Olá!
ResponderExcluirEu acho incrível a forma que o Chico usa suas músicas para representar o momento em que está se passando. Acho que essa é a verdadeira missão da arte, sabe? Protesto, representatividade, registro etc. Mesmo que ele negue que a música fale sobre política, ao ler a letra, vi muitas alusões à ela.
Ele é demais. Ponto. rs
Grande beijo,
Letícia Franca | Além de 50 Tons
https://almde50tons.wordpress.com/
Oi Camyli!!
ResponderExcluirAs músicas do Chico sempre tem mensagens muito importantes. Não só dele, mas outros artistas que usaram a música para protestar numa época tão sombria da nossa história. Eles podem até negar, mas ao ler é bem óbvio rs
Bjs
https://almde50tons.wordpress.com/
A verdade é que a época em que Chico compôs esta letra exigia um protesto camuflado e nisso ele foi muito feliz! Na letra da música, embora implicitamente, ele deu o recado que queria e isso é o máximo!
ResponderExcluirAdorei teu post!
Muito bom! Eu ainda sou estudante e sempre busco mais histórias e informações sobre esses assuntos. Eu não fazia ideia que essa musica guardava tantas mensagens, é muito bom estudar e aprender coisas novas. Seu blog é muito bom, é ótimo para estudos. Amei
ResponderExcluirNossa que interessante, muito legal conhecer o contexto da criação dessa música. Chico Buraque é um excelente autor.
ResponderExcluirOlá!
ResponderExcluiracho incrível como a música e um meio de informar as pessoas de diversas épocas, e que pode até hoje trazer alguma lembrança com o atual momento rs' acho o Chico Buarque um cara inteligente demais.
beijos!