Não estou fazendo apologia à
solidão, mas estar só permite criar mundos que jamais criaríamos se
estivéssemos acompanhados. O terraço da casa dos meus pais é testemunha
concreta desta história. Ele me viu aprontar tantas coisas. Ele foi a tela, o
palco no qual pintei, bordei e interpretei toda a minha infância.
Um dia, fiz uma guerra nascer (hoje
eu sei que toda guerra deve morrer!). De um lado, o Exército Insensível,
comandado pelo maléfico General Cabeça de Balde, com sua multidão de
soldados-tijolos enfileirados numa precisão militar, esperando a ordem superior
para atacar. Nós, das Forças Amadas, não tínhamos comando, estratégia ou
tática de guerrilha. O amor não é subordinável, costuma apenas seguir o
coração. Por isso, às vezes, perde uma ou outra batalha – nunca a guerra! Nas
trincheiras que cavei na montanha de areia destinada à construção de um muro de
proteção coloquei meus soldados-paralelepípedos em posição de defesa. Eu,
montado em meu cavalete quebrado, me sentia um verdadeiro herói da Cavalaria.
Segurava um cabo de vassoura abandonado – que naquele momento eu jurava ser a
ponta da minha espada. Eles atiravam com balas coloridas. E a gente revidava
com uma chuvarada de bolinhas de gude. Depois de um intenso tiroteio, eles
bateram em retirada. Vencemos!
Quem brinca com a imaginação nunca sai
derrotado. Nós hasteamos a bandeira branca – roubada no varal de roupa limpa –
ainda molhada (seria o suor dos nossos heróis imaginários?). Sem mortos, sem
feridos: salvaram-se todos! A criatividade não mata, não fere. A falta dela
talvez…
No dia seguinte, quis ser
astronauta. Aproximei duas camas – a minha e a da minha irmã – e me enfiei
naquele vão. Coloquei um colchão no chão para voar com todo o conforto do
mundo. O painel de controle ficou por conta do meu Game Boy. Se pintasse
algum cometa inesperado no caminho, Mario Bros me ajudaria a saltar e a cumprir
minha missão com êxito. Dois ventiladores na ponta de cada cama eram as
turbinas da minha nave espacial (que potência!). Lençóis vermelhos e laranja
simulavam a energia que me faria abandonar o quarto e alcançar o céu em uma
fração de segundo. Para a minha segurança, improvisei um capacete feito com
papelão e travesseiro. A tripulação – um Playmobil, dois Power Rangers e três
girafinhas – está a postos. Aposto que estão com medo! Um walkie-talkie
assegura a comunicação da nave com a torre de controle. Tudo está sob controle:
podemos ligar os motores! É um pequeno espaço para mim, mas um grande passo
para a criatividade.
PEDRO GABRIEL
Sei como é, porque sou uma pessoa muito individualista. Até demais, na verdade. Acontece que eu sinto a necessidade de ficar um tempo sozinha. E acho que isso é uma característica das pessoas criativas. Quando era menor, brincava. Hoje em dia, escrevo.
ResponderExcluirAdorei o texto.
Também tenho necessidades de ficar sozinha; pensando, escrevendo,lendo....
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